quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

O Natal da Infância de Koseritz

Natal  com neve
 
Noites de Natal

"Era nos anos quarenta (1849): O tão desejado e tão ardentemente esperado dia de Natal estava novamente se aproximando. Há meses que nós crianças tínhamos contado os dias e agora contávamos as horas, pois  na noite anterior havíamos recebido a visita de “Knecht Ruprecht” (figura lendária de advento) que distribuiu nozes, nos ameaçou com uma vara e fez maravilhosas promessas para alguns outros, para a noite que se aproximava.
Muito antes do que de costume acordamos no referido dia, o mais longo de todo o ano (não na realidade, mas sim em relação ao nosso intenso desejo e ansiedade  pela tão esperada noite) e saímos logo após o café da manhã  para o jardim coberto de neve, pois dentro de casa ninguém precisava de nós neste dia. Na ampla sala do jardim de inverno, onde as plantas hibernavam em vasos, mas que no verão servia de sala de visitas para a família e se ofereciam tão belas reuniões sociais, nos acomodamos em um dos aconchegantes divãs que ficavam lá durante o inverno e discutimos todas as prováveis maravilhas que nos esperavam e estavam por vir.
No dia anterior havíamos visitado, por diversas vezes, o mercado de Natal, lançando olhares cobiçosos para as barracas e volta e meio adquirindo pequenos limpa chaminés de ameixas secas, oferecidos por tristes e maltrapilhas crianças, tiritantes de frio.
Stollen
O agitado movimento dentro de casa também não havia passado desapercebido   já  que no dia anterior haviam chegado os “stollen” ( tradicional pão doce  de Natal) da padaria do padeiro Mertens, aqueles pães  cuja massa havia sido preparada em casa e cujo cheiro perfumado, quando de sua entrega, nos deu mostras antecipadas do que seria nossa alegria de Natal.
Papai e mamãe saíram frequentemente; pacotes haviam chegado à casa;  havia um ir e vir intenso de artesãos; isoladas agulhas de folhas de pinheiro espalhadas pelo chão do corredor davam mostras de que a árvore de Natal já havia chegado , fazendo que não nos faltasse assunto para nossas conversas;
Eram três crianças felizes e alegres que estavam reunidas, sentadas  no jardim de inverno: Eu tinha quinze anos, minha irmã treze , meu irmão onze e nenhuma nuvem ainda havia perturbado nossa infância. Oh, maravilhosa juventude, onde o amor de pais e irmãos transformam o mundo em paraíso, onde ainda não se sabe odiar e ainda não se aprendeu a sofrer!
 O assunto preferido era falar sobre os supostos presentes esperados; eu desejava sobretudo as obras de Schiller, minha irmã uma boneca e meu irmão, cavalos e sempre cavalos, naturalmente que de madeira, na esperança de que um dia receberia um real. Depois brincávamos no jardim coberto de neve, fazíamos um boneco de neve, provocávamos pequenas avalanches nos telhados inclinados e várias outras peraltices para passar o tempo, mas as horas não queriam passar, como informava meu relógio de prata ganho no Natal anterior e cujos ponteiros pareciam não se mover do lugar.
Finalmente terminara a longa manhã e fomos chamados para o almoço. Esta parecia ter sido a mais curta hora do dia, pois passou depressa. Depois fui, em disparada, para a pista de gelo que estava formada em cima do lago diante do portão (Diepold) e patinei até o escurecer. No caminho de regresso passei novamente pelas barracas da feira de natal, comprei pão de mel (pfefferkuchen) e doces com passas (rosinenmaenner) e depois subi para o quarto das crianças, onde meus irmãos me esperavam ansiosamente. Consumimos meus   tesouros mas estávamos ficando cada vez mais inquietos. Agora já não eram mais horas que contávamos e sim, minutos. Eu procurava controlar minha impaciência, lendo a “História dos alemães“, de Kolrausch, no capítulo em que falava sobre a cruzada do imperador Rotbarht (Barba ruiva) porém não deu certo. 
Tive que fechar o livro  pois  meu coração batia impaciente no meu peito.
Então nos sentávamos ao redor do fogão e falávamos de política, isto quer dizer, eu repetia para os dois, que ficavam surpresos com meu conhecimento, aquilo que havia ouvido aqui e ali em outras conversas e visto em jornais, a respeito do levante na Polônia, sobre as garantias de paz de Luiz Felipe e da tragédia do pobre Duque de Orleans que havia fraturado o pescoço.
Finalmente chegava Lisette, a doméstica, e nos dizia para que nos preparássemos. Com o coração palpitando no eito com alegre expectativa aguardávamos diante da porta fechada do quarto....e ainda transcorriam minutos...  agora......
Finalmente soava a sineta no andar de baixo.........
Corremos escada a baixo e nos encontramos na entrada.
O pagode chinês sobre o console de mármore parecem concordar solenemente e o espelho na parede reflete a imagem do grupo de crianças que continua aguardando ansiosamente diante da porta ainda fechada do quarto de mamãe,  mas, por onde surgem luzes reveladoras pelas frestas.
Finalmente a porta se abre. Raios de luz vêem ao nosso encontro; a grande e maravilhosa árvore de Natal resplandece com dúzias de velas e debaixo dela estão espalhados os presentes.
A figura alta e fidalga do pai e a presença  elegante da mãe no seu vestido de veludo violeta escuro recebem o pequeno exultante grupo. Amor  infinito e profunda alegria reflete no olhar da mãe e o severo semblante do pai fica suavizado por um sorriso. A já tão antecipada e planejada surpresa e alegria para os filhos é a sua própria alegria e satisfação....
E cada um de nós procura seu antigo lugar e encontra o tão desejado presente. Bem na entrada, defronte a porta, o lugar do pequeno irmão mostra sua riqueza em cavalos. No meio da mesa, diante da estante de livros é o meu lugar e é onde encontro a desejada coleção de Schiller, ricamente encadernada com inscrições em cobre, ao lado de inúmeros outros presentes, provas de imenso amor. A irmã também tem seus sonhos realizados. Alegres mostram uns aos outros os seus tesouros e a noite transcorre em indescritível alegria para todos.


Finalmente as velas queimaram, volta e meia ouve-se o crepitar de um galho de pinheiro chamuscado pela chama; as luzes são apagadas e com pesar as alegres crianças conseguem se separar de seus presentes. Mas amanhã será o feriado e ai é que sabidamente será ainda maior e mais duradoura a alegria natalina. Felizes e satisfeitos nos recolhemos às nossas camas, depois de termos agradecido aos amados pais com beijos e mais beijos.
E na manhã seguinte começa a alegria de fato: depois de termos saboreados o café com “stollen” é aberta a porta da sala e aquele maravilhoso aroma de resina de pinheiro, velas e doces, o “cheiro de natal”, vem ao nosso encontro. Então tudo é novamente examinado nos mínimos detalhes e avaliado à luz do dia...
Como se está rico, como se fica orgulhoso ostentando os belos presentes....
Depois disso a mãe chama, é hora de se preparar para o caminho à igreja e com os corações repletos de crença ouvimos o padre falar do Santíssimo que nasceu para salvar e resgatar o mundo dos pecados e do menino que estava na manjedoura de Belém e mesmo assim era o filho de Deus e nosso Salvador".

Carlos von Kosertiz
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 Texto auto biográfico, extraído do almanaque Koseritz Volkskalender, sob o título "Recordações de Norte e Sul".

Com este belíssimo texto de meu tetravô, desejo um FELIZ NATAL, abençoado e repleto de Luz, para todos os amigos e familiares.

Um grande abraço,

Silvia Meirelles Kaercher

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