segunda-feira, 31 de outubro de 2011

sábado, 29 de outubro de 2011

Carolina von Koseritz, a Carola

Carolina von Koseritz foi uma mulher à frente do seu tempo e isso se deve, muito, à convivência com o pai. Nascida em 23 de outubro de 1865, em Porto Alegre, desde cedo teve sua aptidão literária estimulada, numa época em que as mulheres não se destacavam na sociedade, há não ser por seus casamentos e filantropias. Falava, escrevia e traduzia várias línguas: alemão, inglês, francês, latim, espanhol.
Com o pai, Carolina engajou-se no movimento abolicionista, no estudo da filosofia espírita, no desenvolvimento cultural da Província e na divulgação dos ideais germanistas.
Sua produção literária é admirável. Com treze anos ganha seu primeiro concurso de poesias e passa a receber atenção privilegiada do pai, secretariando-o. Ainda na adolescência, traduziu e publicou vários contos dos clássicos alemães e ingleses. Aos 18 anos, em viagem ao Rio de Janeiro, traduziu e publicou “Réquiem”, um poema do poeta austríaco Dranmour, prefaciado por Sílvio Romero. A crítica da época aplaudiu a “quase menina”.
A partir daí, seguem-se várias publicações de contos próprios e traduções: Hermann e Dorothéa, de Goethe; Excelsion, de Langfellow; Relíquias Vivas, de Turguenoff; Manfredo, Oscar e Masera, de Lord Byron; O Grilo da Lareira, de Charles Dickens.
São produções suas: Uma dor de cabeça; A freira; Um perfil; Uma flor Fenecida; A vingança das Flores; Risos e Sorrisos; Antigualhas e Episódio Obscuro.
A maior parte de suas produções está distribuída pelas páginas corroídas e amareladas dos jornais da época, como o Jornal do Commércio, Koseritz Deutsche Zeitung e Mercantil e escondidas sob pseudônimos. Alguns contos aparecem nas Revistas Kodak e Norte-Sul. Comenta-se que na Biblioteca Nacional existam livros seus.
Conforme descreve sua pesquisadora, Hilda Agnes Hübner Flores, Carolina von Koseritz “pertence ao pequeno grupo de mulheres intelectuais que integraram o romantismo das últimas décadas do século XIX. Tradutora poliglota, enriqueceu o Brasil com literatura alternativa face à dominância do francesismo cultural.
O pioneirismo de Carolina revela-se na projeção da capacidade feminina além dos umbrais domésticos, em busca do lugar adequado que cabe à mulher na sociedade atual.”
Carolina Von Koseritz é nome de rua em Porto Alegre e patrona da cadeira nº. 15 da Academia Literária Feminina do Rio Grande do Sul.
                      Na foto acima, Carolina com seus filhos, João e Carlos.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Um pouco de Carlos von Koseritz

Carlos von Koseritz, nascido em Dessau, capital do ducado de Anhalt, Prússia, atual Alemanha, no dia 03 de fevereiro de 1834, foi uma das maiores e mais fecundas mentes da cultura gaúcha do século XIX, atuando na sociedade como jornalista, escritor, professor e político liberal.
Ainda novo, por volta dos 16 anos de idade, envolveu-se pela primeira vez com a política e os ideais liberais, participando de um levante contra o Kaiser. Por conta disso, o pai o colocou como grumete em um navio e o expulsou de casa.
Aportando no Brasil em 1851, foi recrutado para lutar na Guerra do Paraguai, mas chegando ao Rio Grande do Sul, deu baixa do exército e passou a trabalhar como guarda-livros, professor particular e, mais tarde, como médico leigo, nas cidades de Rio Grande e Pelotas.  
Como conseqüência lógica de seus ideais, Carlos von Koseritz passou a colaborar com os jornais locais e chegou a fundar uma escola para rapazes, em Rio Grande. Naturalizou-se brasileiro e fundou seu próprio jornal, O Brado do Sul, já em Pelotas.
Em 1855, casou-se com a brasileira Zeferina Barbosa. Aproveitava o tempo para escrever sobre Filosofia, Literatura, Política e Economia e para inteirar-se dos acontecimentos de sua época. A vida passou a ficar difícil quando Koseritz resolveu polemizar com os políticos locais. A polícia fechou o jornal e alguns desafetos lhe atacaram violentamente, dando-lhe uma surra. Desfalecido, foi levado para o hospital pela esposa. Assim, Koseritz acaba sendo obrigado a abandonar o jornal e o magistério e muda-se para Porto Alegre, onde é convidado a ser Representante das Colônias Alemãs.
Esse trabalho como intérprete dos colonos alemães, defendendo seus interesses e necessidades perante o governo provincial, vem dar a Koseritz reconhecimento e projeção nacional como defensor do teuto-brasileirismo e mentor do germanismo. Uma publicação sua a respeito das condições de vida dos imigrantes, um minucioso relatório sobre as atividades dos colonos alemães, é base para estudos a respeito da Imigração Alemã no estado, até os dias de hoje.
Foi nessa função de intérprete e defensor que Carlos Von Koseritz participou dos acontecimentos na Colônia de Padre Eterno, atual município de Sapiranga, conhecido como Guerra dos Muckers.  Combatente de toda a manifestação de excesso religioso e conhecedor do abandono das colônias no que dizia respeito à fé e medicina, Carlos posicionou-se contra o culto à Jacobina Maurer e seu postulado de fanatismo. Reconhecia, porém, a ingenuidade dos muckers e acreditava que os supostos curandeiros captaram as boas graças dos colonos menos instruídos.
Escreveu ele a respeito:
“A disposição místico-religiosa da alma germânica foi explorada e os resultados só podem ser explicados tomando-se em consideração a crassa ignorância e estreiteza de espírito dos respectivos grupos.”
Por manifestar-se contra a seita dos muckers, Carlos e a família sofreram sérias represálias. Mas ali, como em todos os outros casos polêmicos em que se envolveu, manteve-se fiel aos seus princípios e conceitos, sempre coerente com seus pensamentos.
A paixão de Carlos von Koseritz era pelas idéias e a elas dedicou toda a sua vida. Mas sua maior contribuição foi, sem dúvida, no jornalismo.
Já em Porto Alegre, foi redator chefe do Deutsche Zeitung por 17 anos. Paralelamente, colaborou e fundou diversos outros jornais. Foi redator do Sentinela do Sul, primeiro jornal ilustrado de Porto Alegre; do A Lanterna, folha dominical ilustrada; um dos fundadores do Eco do Ultramar, literário e cultural e do Combate; redator do jornal do Partido Liberal, A Reforma; fundador e redator da revista Die Austellung, de propaganda e notícia a respeito da Exposição Brasileira-Allemã; do semanário maçônico A Acácia; redator e diretor do Jornal do Commércio; do Mercantil; do A Ordem; do Calendário Anual.
Em 1879 fundou seu próprio jornal, o Gazeta de Porto Alegre, considerado, até então, o melhor jornal do Rio Grande do Sul. Desvinculado de qualquer partido político e mantendo-se apenas da publicidade, venda avulsa e assinaturas, Koseritz pode fazer suas conhecidas críticas e não se sentia mais constrangido em denunciar as injustiças ou por contrariar interesses. Foi através desse jornal que Koseritz começou a polemizar com Júlio de Castilhos.
O jornal alcançou maior projeção em 1883, quando Koseritz entrevistou Dom Pedro II, no Rio de Janeiro, onde o periódico era recebido e lido pelo próprio imperador. A entrevista foi um privilégio concedido a poucos jornalistas. Mas apesar de ter boa tiragem, as finanças do jornal eram deficitárias e o Gazeta de Porto Alegre deixou de circular em 1884, apesar do grande conceito que conquistara.
Mas paralelamente a esse jornal, Koseritz lançara seu próprio jornal alemão, o Koseritz Deutsche Zeitung, em 1881. Em pouco tempo, o jornal alcançou grande receptividade junto ao público de origem teuta, passando a influenciá-lo doutrinariamente. Logo nos primeiros editoriais, já deixava claro o objetivo do jornal:
“O Koseritz Deutsche Zeitung jamais deixará de propugnar pelos direitos da população de origem teuta, pela defesa dos seus interesses, orientando-a na senda do progresso. Todas as aspirações de nossa coletividade de cultura e língua alemãs terão acolhida franca nas nossas colunas e, sempre que for mister reivindicar os direitos postergados, o jornal há de fazê-lo sem restrições.”
Koseritz dirigiu esse jornal até sua morte, em 1890. Mas o periódico continuou circulando por muitos anos ainda, até que, em 1917, passou a denominar-se Gazeta Colonial devido à proibição de imprimir publicações em língua alemã.
Além do jornal alemão, Koseritz também fundou e redigiu o Koseritz Deutsche VolksKalender (Calendário Popular Alemão do Koseritz). Aguardado sempre com grande expectativa, no começo de cada ano, devido aos seus artigos variados, trazia temas como literatura, folclore, ciências, paleontologia, etnologia gaúcha e informações práticas aos agricultores alemães. Esse calendário, tão ao gosto dos colonos alemães, também resistiu à morte de seu fundador e circulou até às vésperas da Primeira Guerra Mundial.
Não é por pouco que o período de 1860 a 1890 é considerado A Era Koseritz do jornalismo rio-grandense.
Mas além de jornalista, Carlos Von Koseritz também era pesquisador e escritor. Dedicou-se com afinco às pesquisas paleontólogas e possuía um grande acervo etnográfico a respeito dos índios do Sul do país. Sobre esse tema lançou os livros A terra e o homem à luz da moderna ciência e Bosquejos Etnológicos. Por sua importante dedicação e interesse nessa área, chegou a ser considerado, por alguns, o criador da etnologia rio-grandense e a maior autoridade do Sul do Brasil, na época.
Na literatura, lançou vários romances, poesias, novelas e peças teatrais.
Na área didática, publicou ainda em Pelotas, em 1856, um Resumo da História Universal, que acabou sendo adotado em várias escolas do Rio Grande do Sul.
Seus livros mais polêmicos eram os da área religiosa. Por Roma perante o Século, onde critica duramente o clero e insurge-se na questão da infalibilidade papal, foi excomungado da Igreja Católica.
De seus mais variados livros, um dos que ainda resta em publicações é o Imagens do Brasil, uma coletânea de cartas enviadas aos seus jornais no Rio Grande do Sul enquanto morou no Rio de Janeiro, por meio ano, com a família. Um riquíssimo documentário a respeito da política, cultura e hábitos da capital do Império.
Versátil, curioso e inteligente, deixou suas idéias a respeito da economia em Resumo da Economia Nacional Especialmente aplicado às circunstâncias atuais do País e para orientar os imigrantes alemães que continuavam a chegar ao Sul, publicou o manual Conselhos aos que imigram para o Brasil, além de uma cartilha com conselhos e ensinamentos sobre agronomia e horticultura, dirigida aos agricultores.
Em 1881, Koseritz lança-se em um grande projeto: a Exposição Brasileira-Allemã. O grande objetivo da exposição era divulgar os produtos brasileiros para os enviados dos principais mercados da Alemanha e, em contrapartida, apresentar aos brasileiros os produtos fabricados pelos alemães. Várias províncias remeteram seus principais produtos, destinados à possível exportação para o mercado alemão. Foi a primeira Exposição Internacional em todo o Império.
Apesar do sucesso de público que teve a Exposição, Koseritz enfrentou a má vontade dos comerciantes alemães de Porto Alegre, que receavam a aproximação entre o público e seus fornecedores, temendo que soubessem dos preços reais das mercadorias que vendiam e os jornais o atacavam, dizendo que tirava vantagens financeiras da Exposição. Para imensa tristeza de Koseritz, o pavilhão onde se realizava a exposição fora criminalmente incendiado e ele perdeu toda a sua coleção etnográfica.
Em 1883, elege-se deputado provincial, após um ano viajando pela província, acompanhado de Gaspar Silveira Martins. Integrante do Partido Liberal e com o apoio da Maçonaria, foi reeleito por quatro mandatos e um dos que mais ocupou a tribuna nesse período.
Tornou-se o porta-voz dos imigrantes alemães. Trabalhou com afinco a favor da educação bilíngüe nas colônias, da construção de estradas e de melhorias na navegação entre Rio Grande e Porto Alegre e das ligações entre as regiões coloniais e a capital da província. Foi contra os privilégios de alguns empresários gaúchos, contra os impostos extorsivos à colônia alemã e a favor da integração dos imigrantes na vida nacional. Tomou para si a bandeira do teuto-brasileirismo e tornou-se o principal representante do germanismo nacional.
Ao lado da filha Carolina, engajou-se na Emancipação dos Escravos e no clube Partenon Literário e em 1884, Porto Alegre tornou-se uma das primeiras cidades a libertar seus negros.
Apesar de Monarquista convicto e amigo de Dom Pedro II, aceitou a República, não combateu e nem conspirou contra o novo regime, porém, queria plena e total liberdade para criticar os procedimentos do governo, que, no seu ponto de vista, “não deveria, em nome da honra do país, restringir a livre expressão do pensamento”.
Mas suas intenções não foram bem recebidas pelo Partido Republicano. Desde antes da Proclamação da República, Koseritz e os líderes republicanos gaúchos Assis Brasil e Júlio de Castilhos duelavam através de seus jornais. Sendo os republicanos os novos governantes do estado e Koseritz o redator chefe do jornal do Partido Liberal, este acabou preso e humilhado, diante das filhas e esposa. Passou uma semana em prisão domiciliar, com guardas armados dentro de sua casa, e com a vida ameaçada.
Resfriados os ânimos políticos, os soldados se foram. Abatido, Koseritz resolveu afastar-se, temporariamente, do Rio Grande do Sul, a fim de procurar ares mais salubres para suas filhas, que ficaram doentes com tantos sofrimentos.
Na véspera de sua partida, escreveu uma carta de despedida ao povo-riograndense e narrou os fatos de sua prisão. Após assinar e datar sentiu uma dor muito forte no peito e chamou pela filha.  Morreu nos braços de Carolina, no dia 30 de maio de 1890.
A herança literária de Koseritz, abrangendo amplas e diversificadas áreas do conhecimento humano, é inigualável no século passado e ainda hoje admirável.
Como bem descreve um de seus biógrafos, nenhum estudo do conjunto da vida mental do Rio Grande do Sul, na segunda metade do século XIX, será válido se dele excluirmos o nome de Carlos von Koseritz.
Combativo, ardente, ainda no mais aceso das discussões, soube dar-lhes o traço ideológico que é o segredo dos espíritos de boa categoria. Nunca esgrimia em vão. Pode, assim, enfrentar com galhardia temas rebarbativos, diante dos quais assentava em bases lógicas a cidadela de sua dialética.
Mas quem era o homem por trás desse mito? Que angústias, sofrimentos e histórias trazia dentro de si? Como era quando penetrava a cena doméstica e deixava as ideologias e polêmicas do lado de fora? Ou será que não as deixava?

Bem vindos!


Inserir a Familia Koseritz no panorama atual não é uma tarefa difícil, mas também não é simples. Existem milhares de sites que fazem alusão ao Carlos von Koseritz ou à Carolina von Kosertiz. Muitos são excelente fonte de pesquisa, outros apresentam informações errôneas. 
Este blog tem o objetivo de divulgar não apenas os fatos e histórias dos Kosertiz, mas também o ambiente histórico e cultural em que viviam: a Porto Alegre do século XIX e XX.
Sintam-se em casa e façam comigo essa viagem extraordinária ao Tempo dos Koseritz!