quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

O Natal da Infância de Koseritz

Natal  com neve
 
Noites de Natal

"Era nos anos quarenta (1849): O tão desejado e tão ardentemente esperado dia de Natal estava novamente se aproximando. Há meses que nós crianças tínhamos contado os dias e agora contávamos as horas, pois  na noite anterior havíamos recebido a visita de “Knecht Ruprecht” (figura lendária de advento) que distribuiu nozes, nos ameaçou com uma vara e fez maravilhosas promessas para alguns outros, para a noite que se aproximava.
Muito antes do que de costume acordamos no referido dia, o mais longo de todo o ano (não na realidade, mas sim em relação ao nosso intenso desejo e ansiedade  pela tão esperada noite) e saímos logo após o café da manhã  para o jardim coberto de neve, pois dentro de casa ninguém precisava de nós neste dia. Na ampla sala do jardim de inverno, onde as plantas hibernavam em vasos, mas que no verão servia de sala de visitas para a família e se ofereciam tão belas reuniões sociais, nos acomodamos em um dos aconchegantes divãs que ficavam lá durante o inverno e discutimos todas as prováveis maravilhas que nos esperavam e estavam por vir.
No dia anterior havíamos visitado, por diversas vezes, o mercado de Natal, lançando olhares cobiçosos para as barracas e volta e meio adquirindo pequenos limpa chaminés de ameixas secas, oferecidos por tristes e maltrapilhas crianças, tiritantes de frio.
Stollen
O agitado movimento dentro de casa também não havia passado desapercebido   já  que no dia anterior haviam chegado os “stollen” ( tradicional pão doce  de Natal) da padaria do padeiro Mertens, aqueles pães  cuja massa havia sido preparada em casa e cujo cheiro perfumado, quando de sua entrega, nos deu mostras antecipadas do que seria nossa alegria de Natal.
Papai e mamãe saíram frequentemente; pacotes haviam chegado à casa;  havia um ir e vir intenso de artesãos; isoladas agulhas de folhas de pinheiro espalhadas pelo chão do corredor davam mostras de que a árvore de Natal já havia chegado , fazendo que não nos faltasse assunto para nossas conversas;
Eram três crianças felizes e alegres que estavam reunidas, sentadas  no jardim de inverno: Eu tinha quinze anos, minha irmã treze , meu irmão onze e nenhuma nuvem ainda havia perturbado nossa infância. Oh, maravilhosa juventude, onde o amor de pais e irmãos transformam o mundo em paraíso, onde ainda não se sabe odiar e ainda não se aprendeu a sofrer!
 O assunto preferido era falar sobre os supostos presentes esperados; eu desejava sobretudo as obras de Schiller, minha irmã uma boneca e meu irmão, cavalos e sempre cavalos, naturalmente que de madeira, na esperança de que um dia receberia um real. Depois brincávamos no jardim coberto de neve, fazíamos um boneco de neve, provocávamos pequenas avalanches nos telhados inclinados e várias outras peraltices para passar o tempo, mas as horas não queriam passar, como informava meu relógio de prata ganho no Natal anterior e cujos ponteiros pareciam não se mover do lugar.
Finalmente terminara a longa manhã e fomos chamados para o almoço. Esta parecia ter sido a mais curta hora do dia, pois passou depressa. Depois fui, em disparada, para a pista de gelo que estava formada em cima do lago diante do portão (Diepold) e patinei até o escurecer. No caminho de regresso passei novamente pelas barracas da feira de natal, comprei pão de mel (pfefferkuchen) e doces com passas (rosinenmaenner) e depois subi para o quarto das crianças, onde meus irmãos me esperavam ansiosamente. Consumimos meus   tesouros mas estávamos ficando cada vez mais inquietos. Agora já não eram mais horas que contávamos e sim, minutos. Eu procurava controlar minha impaciência, lendo a “História dos alemães“, de Kolrausch, no capítulo em que falava sobre a cruzada do imperador Rotbarht (Barba ruiva) porém não deu certo. 
Tive que fechar o livro  pois  meu coração batia impaciente no meu peito.
Então nos sentávamos ao redor do fogão e falávamos de política, isto quer dizer, eu repetia para os dois, que ficavam surpresos com meu conhecimento, aquilo que havia ouvido aqui e ali em outras conversas e visto em jornais, a respeito do levante na Polônia, sobre as garantias de paz de Luiz Felipe e da tragédia do pobre Duque de Orleans que havia fraturado o pescoço.
Finalmente chegava Lisette, a doméstica, e nos dizia para que nos preparássemos. Com o coração palpitando no eito com alegre expectativa aguardávamos diante da porta fechada do quarto....e ainda transcorriam minutos...  agora......
Finalmente soava a sineta no andar de baixo.........
Corremos escada a baixo e nos encontramos na entrada.
O pagode chinês sobre o console de mármore parecem concordar solenemente e o espelho na parede reflete a imagem do grupo de crianças que continua aguardando ansiosamente diante da porta ainda fechada do quarto de mamãe,  mas, por onde surgem luzes reveladoras pelas frestas.
Finalmente a porta se abre. Raios de luz vêem ao nosso encontro; a grande e maravilhosa árvore de Natal resplandece com dúzias de velas e debaixo dela estão espalhados os presentes.
A figura alta e fidalga do pai e a presença  elegante da mãe no seu vestido de veludo violeta escuro recebem o pequeno exultante grupo. Amor  infinito e profunda alegria reflete no olhar da mãe e o severo semblante do pai fica suavizado por um sorriso. A já tão antecipada e planejada surpresa e alegria para os filhos é a sua própria alegria e satisfação....
E cada um de nós procura seu antigo lugar e encontra o tão desejado presente. Bem na entrada, defronte a porta, o lugar do pequeno irmão mostra sua riqueza em cavalos. No meio da mesa, diante da estante de livros é o meu lugar e é onde encontro a desejada coleção de Schiller, ricamente encadernada com inscrições em cobre, ao lado de inúmeros outros presentes, provas de imenso amor. A irmã também tem seus sonhos realizados. Alegres mostram uns aos outros os seus tesouros e a noite transcorre em indescritível alegria para todos.


Finalmente as velas queimaram, volta e meia ouve-se o crepitar de um galho de pinheiro chamuscado pela chama; as luzes são apagadas e com pesar as alegres crianças conseguem se separar de seus presentes. Mas amanhã será o feriado e ai é que sabidamente será ainda maior e mais duradoura a alegria natalina. Felizes e satisfeitos nos recolhemos às nossas camas, depois de termos agradecido aos amados pais com beijos e mais beijos.
E na manhã seguinte começa a alegria de fato: depois de termos saboreados o café com “stollen” é aberta a porta da sala e aquele maravilhoso aroma de resina de pinheiro, velas e doces, o “cheiro de natal”, vem ao nosso encontro. Então tudo é novamente examinado nos mínimos detalhes e avaliado à luz do dia...
Como se está rico, como se fica orgulhoso ostentando os belos presentes....
Depois disso a mãe chama, é hora de se preparar para o caminho à igreja e com os corações repletos de crença ouvimos o padre falar do Santíssimo que nasceu para salvar e resgatar o mundo dos pecados e do menino que estava na manjedoura de Belém e mesmo assim era o filho de Deus e nosso Salvador".

Carlos von Kosertiz
...............................................................................................................................

 Texto auto biográfico, extraído do almanaque Koseritz Volkskalender, sob o título "Recordações de Norte e Sul".

Com este belíssimo texto de meu tetravô, desejo um FELIZ NATAL, abençoado e repleto de Luz, para todos os amigos e familiares.

Um grande abraço,

Silvia Meirelles Kaercher

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

O encontro da Arte e da Literatura


Em uma noite em que a Cultura foi  a maior homenageada, Silvia Meirelles Kaercher fez o lançamento de seu livro "Carola". 
Amigos e familiares puderam respirar o ar abarrotado de beleza e encantamento, que as obras do artista plástico Frederico Scheffel proporcionam ao local, na sede da Fundação que leva seu nome. Obras de arte, de inspiradoras formas, enfeitam o local, o único museu dedicado à obras de um único artista, vivo, da América Latina! Telas, esculturas, esboços, poesias... o local emana cultura e beleza.
Dentre as obras, que chamam atenção pelo tamanho e perfeição dos traços, encontramos um laço forte para a escritora. Com a mesa de autógrafos posicionada em frente à obra "Rixa Gaúcha", nos deparamos com uma figura deitada no chão, provavelmente atingido durante a luta. Um ser, de costas, envolvido em sua dor. O modelo para tal figura é o avô de Sílvia, o jornalista Alceu Feijó, que em sua juventude, foi "modelo" de Scheffel.
Com a presença de mais de cem pessoas, entre amigos, familiares, autoridades, o pessoal da Editora Novitas  e o próprio Frederico Scheffel, a noite ficará para sempre na memória de todos.
Silvia Meirelles Kaercher, autografando.

O livro Carola está à venda no site da editora www.editoranovitas.com.br  e na Livraria FLAMA (Av. Joaquim Nabuco, 766, Centro,Novo Hamburgo,  fone 51. 3593. 6644), pelo valor de R$ 35,00.


A autora Silvia M.Kaercher  ao lado de Frederico Scheffel (esq.) e Angelo Reinheimer (curador)


Leticia Coelho e David Nobrega, editores da Novitas, com o jornalista Alceu Feijó, avô da escritora.



Ao fundo, a tela "Rixa Gaúcha", de Frederico Scheffel.




terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Entrevista na Rádio 900AM

Entrevista com a autora do livro "Carola", Silvia Meirelles Kaercher, ao programa "Sábado News", com Diana Mendel., no dia 10/12/2011.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

RARIDADE: CERTIDÃO DE NASCIMENTO DE KOSERITZ

Nos muitos anos em que pesquisei sobre Carlos von Koseritz, a maior duvida que encontrei era sobre sua data de nascimento. Haviam tantas datas diferentes, meses, anos, dias.... Cada biografo afirmava uma data. Quem acabou de vez com esta dúvida foi  Thomas Keil, um amigo alemão, que encontrou uma cópia da certidão de nascimento do Koseritz no Instituto Martius Staden, em São Paulo. Ali, escrita à mão, em bico de pena, está a data correta: 3 de fevereiro de 1834! 
Apresenta também o local do batismo, Igreja e Castelo de Stª Mary, no dia 16 de março de 1834 e apresenta os nomes dos padrinhos, entre eles, a avó paterna, Frau von Koseritz.
Um documento de extraordinária força e importância. 

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Resenha para "Carola"

Ler “Carola” é mergulhar nas memórias de uma família e sentir o amor que os uniu, as paixões que os arrebataram e a tragédia que os abateu, destruindo sonhos e esperanças. É perceber que a vida tem seu próprio enredo e traçamos sua trajetória, às vezes tortuosa, na direção de um outro fim, num rumo sempre inesperado.
Muitas vezes, durante os anos de pesquisa em que se envolveu, a autora se deparou com os caprichos do destino, tão mais criativo e inusitado do que qualquer outro enredo. A vida é muito criativa! E é essa força que se sente ao ler “Carola”. Uma história real, que poderia ter acontecido com qualquer um de nós.
Ao desvendar esses mistérios, em meio a fatos, nomes, momentos da História do País e do Rio Grande do Sul, deparamo-nos com a vida dessa mulher forte e frágil, sonhadora, apaixonada e infeliz , com a qual tecemos fortes laços de empatia  justamente por senti-la verdadeira, acima de tudo.
Da infância e juventude cercadas de amor e brilhantismo ao lado do pai, o grande jornalista, deputado provincial, advogado, professor e germanista Carlos von Koseritz, à tragédia pessoal em que transformou sua vida, a saga da mulher que foi Carolina von Koseritz, hoje Patrona da Cadeira nº 15 da Academia Feminina de Letras do Rio Grande do Sul, ficará inapagável em sua memória.
                                                                           

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Lançamento "Carola"

Dia 14 de Dezembro de 2011, a partir das 20h, nos amplos e belíssimos salões da sede da Fundação Frederico Ernesto Scheffel, em Novo Hamburgo/RS, haverá o lançamento do livro "Carola", biografia romanceada da família Koseritz, da escritora Silvia Meirelles Kaercher, pela Editora Novitas.
Prestigie!

sábado, 12 de novembro de 2011

Bibliografia de Carlos von Koseritz

Carlos von Koseritz foi um escritor compulsivo! Além de colaborar com diversos jornais de sua época, mantinha seus próprios semanários e diários, escrevendo em português e alemão. Por vezes, vendia artigos para outros jornais e escrevia textos para outros assinarem.
Mas a imensa maioria de sua obra admirável, encontra-se deteriorada nas páginas amareladas e esquecidas dos jornais do século XIX. Alguns destes textos formaram livros e uma pequena minoria sobreviveu ao tempo e ao esquecimento. Na biblioteca da Unisinos, encontram-se alguns exemplares e outros textos estão compilados em livros de autores que o estudaram.
Koseritz publicou textos nas mais variadas formas: peças de teatro; romances;livros didáticos; artigos científicos; relatos de viagens, peças teatrais, e nos mais variados temas: economia, etnologia, germanismo, maçonaria, direito, religião, romances e poesias. Sua obra é vasta e admirável.
Dentre todos os textos de Koseritz, o que alcançou nosso tempo ainda em publicação foi o diário de viagem "Imagens do Brasil", onde narra os meses que passou no Rio de Janeiro, então capital do Império, e suas impressões a respeito do ambiente social, cultural e político. Originalmente publicado em uma coluna em seu jornal "Gazeta de Porto Alegre", os textos foram reunidos em um livro e  publicados inicialmente em alemão e mais tarde traduzido por Afonso Arinos.
De leitura agradável, possibilita-nos uma viagem ao tempo do império, encontros com D. Pedro II e outras grandes figuras de nossa História, além de uma visita a uma cidade em toda a sua grandiosidade: a Capital do Império Brasileiro, Rio de Janeiro, em um relato fidedigno de como era a vida naquele tempo. É um livro indispensável para o conhecimento da última década do Império Brasileiro.


Imperdível!

Obs.: Edições esgotadas, disponível apenas em sebos.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Jazigo da Família Koseritz

30/01/1926 - Correio do Povo Anno XXXII - Num 25 p.4 - HOMENAGEM A CARLOS VON KOSERITZ - "A 7 do próximo mez de fevereiro, será inaugurado no Cemitério Protestante desta capital, um monumento a Carlos von Koseritz, homenagem que os elementos germânicos e brasileiros irão prestar à memória do grande jornalista e homem de sciência. Há muito tempo, desde que elle falleceu, foi pensamento de muitos de seus admiradores  consagrar-lhe, de forma imperecivel, um preito de gratidão e de respeito. (...) A inauguração do monumento, que é talhado em granito das colonias e contem symbolos brasileiros e allemães, representativos, sobretudo, da personalidade de Carlos von Koseritz, reverter-se-á de toda a solenidade, havendo discursos, comparecimento das escolas do "Turner-Bund" e da primitiva escola de escoteiros de Canôas, também sendo cantados hymnos em grande massas coraes e figurando a velha e tradicional bandeira dos "Scouts". No trato da terra, onde, por doação da colonia allemã, aqui então domiciliada, repousam os restos mortaes de Carlos von Koseritz, também foram sepultadas suas esposa, Zeferina von Kosertiz e sua filha dilecta Carolina von Koseritz, às quaes também serão prestadas as devidas homenagens no monumento. Ao dar esta notícia, o "Correio do Povo" o faz com a maior satisfação, pois o fundador deste jornal, o saudoso Caldas Junior, foi discípulo de Carlos von Koseritz, nas lidas da imprensa".


TEXTO COLETADO EM  "Caderno de Pesquisa - Noticia da Imigração Italiana", de Rosemary Fritsch Brum.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Exposição Brasileira-Allemã

A Exposição Brasileira-Allemã foi uma das grandes idealizações e realizações de Carlos von Koseritz. Realizada em Porto Alegre, inaugurou no dia 4 de outubro de 1881 e durou 4 meses. 
Abaixo, o texto da Wikipédia sobre o evento.

Exposição Brasileira-Allemã foi uma exposição internacional de agriculturaindústria e comércio realizada em Porto Alegre em 1881.
Foi parte do ciclo de exposições industriais realizadas pelo governo provincial em 1866, 1875, 1881 e 1901.[1] Organizada por Carlos von Koseritz, foi a primeira exposição mundial realizada no Brasil. Nela foram expostos tanto produtos alemães, quanto brasileiros, dando ênfase nos produzidos peloscolonos alemães no Brasil. O grande objetivo da Exposição era divulgar os produtos brasileiros para os enviados dos principais mercados da Alemanhae, em contrapartida, apresentar aos brasileiros os produtos fabricados pelos alemães.
A exposição foi realizada na chácara da Harmonia, de propriedade de Carlos Trein, fato que gerou críticas a Koseritz, acusado de tirar vantagens financeiras.
Várias províncias remeteram seus principais produtos, destinados à possível exportação para o mercado alemão. Do Rio Grande do Sul vieram produtos de várias cidades: de Passo Fundo foi trazido trigo, de Três Coroas artigos da indústria de courolinhoalgodãolicores destilados a vapor e tijolos ocos vieram de Santa Cruz do Sulfumo de Taquara, etc.
A exposição também teve uma parte artística, com obras variadas abrangendo pinturadesenhoescultura ornamental e fotografia, além de marcenaria,tornearia, trabalhos manuais ( bordado sobre papel e navios em miniatura) e artesanato indígena. Entre os artistas estavam Frederico TrebbiBalduíno Röhrig e Pedro Weingärtner, este lá participou de sua primeira exposição coletiva. Além dos fotógrafos Luigi TerragnoAugusto Amoretty (medalha de ouro), Eduardo von Borowski, Santiago da Costa, João King, A. Steckel e Balduíno Röhrig.; e escultores de mármore, como Adriano Pittanti, expondo um premiado "lavatório-toalete de mármore (pedestal, mesa, bacia, colunas e moldura para espelho)". A Livraria Americana de Pelotas recebeu o primeiro prêmio, por suas edições. [2]
Os melhores participantes foram premiados com medalhas comemorativas, premiação esta que levou a desacordos entre a população brasileira e de origem alemã. Por causa destes conflitos foi incendiado o pavilhão principal da exposição, com a perda da maior parte dos itens ali expostos, entre eles a coleção etnográfica de Koseritz, além de outras coleções de zoologiamineralogia ebotânica.
Publicado em "Almanaque Gaúcho", jornal Zero Hora.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

sábado, 29 de outubro de 2011

Carolina von Koseritz, a Carola

Carolina von Koseritz foi uma mulher à frente do seu tempo e isso se deve, muito, à convivência com o pai. Nascida em 23 de outubro de 1865, em Porto Alegre, desde cedo teve sua aptidão literária estimulada, numa época em que as mulheres não se destacavam na sociedade, há não ser por seus casamentos e filantropias. Falava, escrevia e traduzia várias línguas: alemão, inglês, francês, latim, espanhol.
Com o pai, Carolina engajou-se no movimento abolicionista, no estudo da filosofia espírita, no desenvolvimento cultural da Província e na divulgação dos ideais germanistas.
Sua produção literária é admirável. Com treze anos ganha seu primeiro concurso de poesias e passa a receber atenção privilegiada do pai, secretariando-o. Ainda na adolescência, traduziu e publicou vários contos dos clássicos alemães e ingleses. Aos 18 anos, em viagem ao Rio de Janeiro, traduziu e publicou “Réquiem”, um poema do poeta austríaco Dranmour, prefaciado por Sílvio Romero. A crítica da época aplaudiu a “quase menina”.
A partir daí, seguem-se várias publicações de contos próprios e traduções: Hermann e Dorothéa, de Goethe; Excelsion, de Langfellow; Relíquias Vivas, de Turguenoff; Manfredo, Oscar e Masera, de Lord Byron; O Grilo da Lareira, de Charles Dickens.
São produções suas: Uma dor de cabeça; A freira; Um perfil; Uma flor Fenecida; A vingança das Flores; Risos e Sorrisos; Antigualhas e Episódio Obscuro.
A maior parte de suas produções está distribuída pelas páginas corroídas e amareladas dos jornais da época, como o Jornal do Commércio, Koseritz Deutsche Zeitung e Mercantil e escondidas sob pseudônimos. Alguns contos aparecem nas Revistas Kodak e Norte-Sul. Comenta-se que na Biblioteca Nacional existam livros seus.
Conforme descreve sua pesquisadora, Hilda Agnes Hübner Flores, Carolina von Koseritz “pertence ao pequeno grupo de mulheres intelectuais que integraram o romantismo das últimas décadas do século XIX. Tradutora poliglota, enriqueceu o Brasil com literatura alternativa face à dominância do francesismo cultural.
O pioneirismo de Carolina revela-se na projeção da capacidade feminina além dos umbrais domésticos, em busca do lugar adequado que cabe à mulher na sociedade atual.”
Carolina Von Koseritz é nome de rua em Porto Alegre e patrona da cadeira nº. 15 da Academia Literária Feminina do Rio Grande do Sul.
                      Na foto acima, Carolina com seus filhos, João e Carlos.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Um pouco de Carlos von Koseritz

Carlos von Koseritz, nascido em Dessau, capital do ducado de Anhalt, Prússia, atual Alemanha, no dia 03 de fevereiro de 1834, foi uma das maiores e mais fecundas mentes da cultura gaúcha do século XIX, atuando na sociedade como jornalista, escritor, professor e político liberal.
Ainda novo, por volta dos 16 anos de idade, envolveu-se pela primeira vez com a política e os ideais liberais, participando de um levante contra o Kaiser. Por conta disso, o pai o colocou como grumete em um navio e o expulsou de casa.
Aportando no Brasil em 1851, foi recrutado para lutar na Guerra do Paraguai, mas chegando ao Rio Grande do Sul, deu baixa do exército e passou a trabalhar como guarda-livros, professor particular e, mais tarde, como médico leigo, nas cidades de Rio Grande e Pelotas.  
Como conseqüência lógica de seus ideais, Carlos von Koseritz passou a colaborar com os jornais locais e chegou a fundar uma escola para rapazes, em Rio Grande. Naturalizou-se brasileiro e fundou seu próprio jornal, O Brado do Sul, já em Pelotas.
Em 1855, casou-se com a brasileira Zeferina Barbosa. Aproveitava o tempo para escrever sobre Filosofia, Literatura, Política e Economia e para inteirar-se dos acontecimentos de sua época. A vida passou a ficar difícil quando Koseritz resolveu polemizar com os políticos locais. A polícia fechou o jornal e alguns desafetos lhe atacaram violentamente, dando-lhe uma surra. Desfalecido, foi levado para o hospital pela esposa. Assim, Koseritz acaba sendo obrigado a abandonar o jornal e o magistério e muda-se para Porto Alegre, onde é convidado a ser Representante das Colônias Alemãs.
Esse trabalho como intérprete dos colonos alemães, defendendo seus interesses e necessidades perante o governo provincial, vem dar a Koseritz reconhecimento e projeção nacional como defensor do teuto-brasileirismo e mentor do germanismo. Uma publicação sua a respeito das condições de vida dos imigrantes, um minucioso relatório sobre as atividades dos colonos alemães, é base para estudos a respeito da Imigração Alemã no estado, até os dias de hoje.
Foi nessa função de intérprete e defensor que Carlos Von Koseritz participou dos acontecimentos na Colônia de Padre Eterno, atual município de Sapiranga, conhecido como Guerra dos Muckers.  Combatente de toda a manifestação de excesso religioso e conhecedor do abandono das colônias no que dizia respeito à fé e medicina, Carlos posicionou-se contra o culto à Jacobina Maurer e seu postulado de fanatismo. Reconhecia, porém, a ingenuidade dos muckers e acreditava que os supostos curandeiros captaram as boas graças dos colonos menos instruídos.
Escreveu ele a respeito:
“A disposição místico-religiosa da alma germânica foi explorada e os resultados só podem ser explicados tomando-se em consideração a crassa ignorância e estreiteza de espírito dos respectivos grupos.”
Por manifestar-se contra a seita dos muckers, Carlos e a família sofreram sérias represálias. Mas ali, como em todos os outros casos polêmicos em que se envolveu, manteve-se fiel aos seus princípios e conceitos, sempre coerente com seus pensamentos.
A paixão de Carlos von Koseritz era pelas idéias e a elas dedicou toda a sua vida. Mas sua maior contribuição foi, sem dúvida, no jornalismo.
Já em Porto Alegre, foi redator chefe do Deutsche Zeitung por 17 anos. Paralelamente, colaborou e fundou diversos outros jornais. Foi redator do Sentinela do Sul, primeiro jornal ilustrado de Porto Alegre; do A Lanterna, folha dominical ilustrada; um dos fundadores do Eco do Ultramar, literário e cultural e do Combate; redator do jornal do Partido Liberal, A Reforma; fundador e redator da revista Die Austellung, de propaganda e notícia a respeito da Exposição Brasileira-Allemã; do semanário maçônico A Acácia; redator e diretor do Jornal do Commércio; do Mercantil; do A Ordem; do Calendário Anual.
Em 1879 fundou seu próprio jornal, o Gazeta de Porto Alegre, considerado, até então, o melhor jornal do Rio Grande do Sul. Desvinculado de qualquer partido político e mantendo-se apenas da publicidade, venda avulsa e assinaturas, Koseritz pode fazer suas conhecidas críticas e não se sentia mais constrangido em denunciar as injustiças ou por contrariar interesses. Foi através desse jornal que Koseritz começou a polemizar com Júlio de Castilhos.
O jornal alcançou maior projeção em 1883, quando Koseritz entrevistou Dom Pedro II, no Rio de Janeiro, onde o periódico era recebido e lido pelo próprio imperador. A entrevista foi um privilégio concedido a poucos jornalistas. Mas apesar de ter boa tiragem, as finanças do jornal eram deficitárias e o Gazeta de Porto Alegre deixou de circular em 1884, apesar do grande conceito que conquistara.
Mas paralelamente a esse jornal, Koseritz lançara seu próprio jornal alemão, o Koseritz Deutsche Zeitung, em 1881. Em pouco tempo, o jornal alcançou grande receptividade junto ao público de origem teuta, passando a influenciá-lo doutrinariamente. Logo nos primeiros editoriais, já deixava claro o objetivo do jornal:
“O Koseritz Deutsche Zeitung jamais deixará de propugnar pelos direitos da população de origem teuta, pela defesa dos seus interesses, orientando-a na senda do progresso. Todas as aspirações de nossa coletividade de cultura e língua alemãs terão acolhida franca nas nossas colunas e, sempre que for mister reivindicar os direitos postergados, o jornal há de fazê-lo sem restrições.”
Koseritz dirigiu esse jornal até sua morte, em 1890. Mas o periódico continuou circulando por muitos anos ainda, até que, em 1917, passou a denominar-se Gazeta Colonial devido à proibição de imprimir publicações em língua alemã.
Além do jornal alemão, Koseritz também fundou e redigiu o Koseritz Deutsche VolksKalender (Calendário Popular Alemão do Koseritz). Aguardado sempre com grande expectativa, no começo de cada ano, devido aos seus artigos variados, trazia temas como literatura, folclore, ciências, paleontologia, etnologia gaúcha e informações práticas aos agricultores alemães. Esse calendário, tão ao gosto dos colonos alemães, também resistiu à morte de seu fundador e circulou até às vésperas da Primeira Guerra Mundial.
Não é por pouco que o período de 1860 a 1890 é considerado A Era Koseritz do jornalismo rio-grandense.
Mas além de jornalista, Carlos Von Koseritz também era pesquisador e escritor. Dedicou-se com afinco às pesquisas paleontólogas e possuía um grande acervo etnográfico a respeito dos índios do Sul do país. Sobre esse tema lançou os livros A terra e o homem à luz da moderna ciência e Bosquejos Etnológicos. Por sua importante dedicação e interesse nessa área, chegou a ser considerado, por alguns, o criador da etnologia rio-grandense e a maior autoridade do Sul do Brasil, na época.
Na literatura, lançou vários romances, poesias, novelas e peças teatrais.
Na área didática, publicou ainda em Pelotas, em 1856, um Resumo da História Universal, que acabou sendo adotado em várias escolas do Rio Grande do Sul.
Seus livros mais polêmicos eram os da área religiosa. Por Roma perante o Século, onde critica duramente o clero e insurge-se na questão da infalibilidade papal, foi excomungado da Igreja Católica.
De seus mais variados livros, um dos que ainda resta em publicações é o Imagens do Brasil, uma coletânea de cartas enviadas aos seus jornais no Rio Grande do Sul enquanto morou no Rio de Janeiro, por meio ano, com a família. Um riquíssimo documentário a respeito da política, cultura e hábitos da capital do Império.
Versátil, curioso e inteligente, deixou suas idéias a respeito da economia em Resumo da Economia Nacional Especialmente aplicado às circunstâncias atuais do País e para orientar os imigrantes alemães que continuavam a chegar ao Sul, publicou o manual Conselhos aos que imigram para o Brasil, além de uma cartilha com conselhos e ensinamentos sobre agronomia e horticultura, dirigida aos agricultores.
Em 1881, Koseritz lança-se em um grande projeto: a Exposição Brasileira-Allemã. O grande objetivo da exposição era divulgar os produtos brasileiros para os enviados dos principais mercados da Alemanha e, em contrapartida, apresentar aos brasileiros os produtos fabricados pelos alemães. Várias províncias remeteram seus principais produtos, destinados à possível exportação para o mercado alemão. Foi a primeira Exposição Internacional em todo o Império.
Apesar do sucesso de público que teve a Exposição, Koseritz enfrentou a má vontade dos comerciantes alemães de Porto Alegre, que receavam a aproximação entre o público e seus fornecedores, temendo que soubessem dos preços reais das mercadorias que vendiam e os jornais o atacavam, dizendo que tirava vantagens financeiras da Exposição. Para imensa tristeza de Koseritz, o pavilhão onde se realizava a exposição fora criminalmente incendiado e ele perdeu toda a sua coleção etnográfica.
Em 1883, elege-se deputado provincial, após um ano viajando pela província, acompanhado de Gaspar Silveira Martins. Integrante do Partido Liberal e com o apoio da Maçonaria, foi reeleito por quatro mandatos e um dos que mais ocupou a tribuna nesse período.
Tornou-se o porta-voz dos imigrantes alemães. Trabalhou com afinco a favor da educação bilíngüe nas colônias, da construção de estradas e de melhorias na navegação entre Rio Grande e Porto Alegre e das ligações entre as regiões coloniais e a capital da província. Foi contra os privilégios de alguns empresários gaúchos, contra os impostos extorsivos à colônia alemã e a favor da integração dos imigrantes na vida nacional. Tomou para si a bandeira do teuto-brasileirismo e tornou-se o principal representante do germanismo nacional.
Ao lado da filha Carolina, engajou-se na Emancipação dos Escravos e no clube Partenon Literário e em 1884, Porto Alegre tornou-se uma das primeiras cidades a libertar seus negros.
Apesar de Monarquista convicto e amigo de Dom Pedro II, aceitou a República, não combateu e nem conspirou contra o novo regime, porém, queria plena e total liberdade para criticar os procedimentos do governo, que, no seu ponto de vista, “não deveria, em nome da honra do país, restringir a livre expressão do pensamento”.
Mas suas intenções não foram bem recebidas pelo Partido Republicano. Desde antes da Proclamação da República, Koseritz e os líderes republicanos gaúchos Assis Brasil e Júlio de Castilhos duelavam através de seus jornais. Sendo os republicanos os novos governantes do estado e Koseritz o redator chefe do jornal do Partido Liberal, este acabou preso e humilhado, diante das filhas e esposa. Passou uma semana em prisão domiciliar, com guardas armados dentro de sua casa, e com a vida ameaçada.
Resfriados os ânimos políticos, os soldados se foram. Abatido, Koseritz resolveu afastar-se, temporariamente, do Rio Grande do Sul, a fim de procurar ares mais salubres para suas filhas, que ficaram doentes com tantos sofrimentos.
Na véspera de sua partida, escreveu uma carta de despedida ao povo-riograndense e narrou os fatos de sua prisão. Após assinar e datar sentiu uma dor muito forte no peito e chamou pela filha.  Morreu nos braços de Carolina, no dia 30 de maio de 1890.
A herança literária de Koseritz, abrangendo amplas e diversificadas áreas do conhecimento humano, é inigualável no século passado e ainda hoje admirável.
Como bem descreve um de seus biógrafos, nenhum estudo do conjunto da vida mental do Rio Grande do Sul, na segunda metade do século XIX, será válido se dele excluirmos o nome de Carlos von Koseritz.
Combativo, ardente, ainda no mais aceso das discussões, soube dar-lhes o traço ideológico que é o segredo dos espíritos de boa categoria. Nunca esgrimia em vão. Pode, assim, enfrentar com galhardia temas rebarbativos, diante dos quais assentava em bases lógicas a cidadela de sua dialética.
Mas quem era o homem por trás desse mito? Que angústias, sofrimentos e histórias trazia dentro de si? Como era quando penetrava a cena doméstica e deixava as ideologias e polêmicas do lado de fora? Ou será que não as deixava?

Bem vindos!


Inserir a Familia Koseritz no panorama atual não é uma tarefa difícil, mas também não é simples. Existem milhares de sites que fazem alusão ao Carlos von Koseritz ou à Carolina von Kosertiz. Muitos são excelente fonte de pesquisa, outros apresentam informações errôneas. 
Este blog tem o objetivo de divulgar não apenas os fatos e histórias dos Kosertiz, mas também o ambiente histórico e cultural em que viviam: a Porto Alegre do século XIX e XX.
Sintam-se em casa e façam comigo essa viagem extraordinária ao Tempo dos Koseritz!